CERI TOH

Ceri toh quer dizer Seridó na língua indígena. O historiador Câmara Cascudo escreveu que Ceri toh significa sem folhagem, pouca folhagem, pouca sombra ou cobertura vegetal, segundo Coriolano de Medeiros...Também ouvi de meu pai que significa paisagem desnuda e gosto mais dessa expressão.
Segundo os judeus significa "refúgio Dele", originada da palavra hebraica she ´eritó, assemelhando-se muito com a palavra Seridó.
De qualquer forma, esta palavra está impregnada em mim desde tempos imemoriais...

sexta-feira, 6 de agosto de 2010


Por que a chuva chega a molhar minha alma? Por que sou tão seca num dia ensolarado? Minhas raízes estão lá no sertão e tiram da terra seca a essência da vida. Minha alma lança-se em fuga, empreende vôos inimagináveis para ser cerca de pedra e mandacaru. E se a alma levita de olho arregalado de espanto e prazer, o corpo padece as malquerenças do verão quase que perpétuo e se fixa no solo fincando raízes. Há pelo ar prenúncio de que todos os sonhos vêm com os ventos de inverno. E a brisa mansa com cheiro de verde acalenta com uma canção de rio manso correndo. Quem nunca viu a seca de perto jamais vai me entender. Quem nunca viu um choro sem lágrimas não sabe a dor de sorrir numa boca com fome. O sertão é tão vasto que existe em todas as almas. Ávida, busco o sumo doce da flor de mandacaru. Agressiva, devoro todos os quereres com a fome do carcará. E se há de ser lenta a agonia da morte, que venha como chuva fina que dá de beber a terra seca, de uma secura quase que eterna, mas que abriga em seu seio o mistério da vida e da morte...
Reencontro Acari. O cheiro de verde entope as narinas. Tudo concorre para a alegria: a feira de rua, o burburinho da chuva de ontem que ainda respinga das algarobas, a conversa mole no café do mercado, a beleza dura das pedras do Gargalheiras. A cidadezinha tem seus encantos escondidos em pedra bruta. Nos olhos das pessoas. Nos sonhos das meninas adolescentes, como um dia eu fui. Reencontro-a comovida. Mora dentro de mim como um espinho de coroa-de-frade, belo e dolorido. Tem altos e baixos como a minha alma discreta. Respiro a terra em que nasci e encontro em mim todos os seus becos com todos os seus pecados mais indecentes. Encontro em mim a beleza da canção do sino tocando a hora do Ângelus. Um anjo abençoa toda a cidade e encantado torna-se homem para viver por lá. A cantiga da carroça de boi, a roupa de couro, o queijo quente, a tapioca, o tamborete e a rede na varanda fazem parte de mim. Como não existiria a poesia, se ela está presente em mim desde tempos imemoriais?

3 comentários:

  1. Que belas suas palavras!
    Parabéns amiga de velhos tempos, cada dia te admiro mais.
    Um forte abraço cheio de saudades.
    Edja

    ResponderExcluir
  2. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  3. Adoro esse texto...
    Quando eu disse que fui expulsa do paraíso...eu dizia que é a minha alma sertânica que desaprendi... a minha identidade está lá e eu aqui...em tudo que me desfaço é pra marcar um reencontro ainda sem hora e lugar...
    Mas eu reconheço o sal do sertão, mesmo sendo de outro sertão...eu sinto o que você fala....no Centro Oeste de onde eu vim não tem seca sem mandacarú, tem seca de cerrado que se queima pras duras sementes saírem de dentro de suas cascas e é uma vastidão de perder em si mesmo...E eu estou aqui...tentando encontrar o caminho de volta!
    Que felicidade ver você viver a sua terra, falar dela! Feliz por você!
    Um beijo....

    ResponderExcluir